Torres combateu cloroquina e aglomerações, defendeu uso de máscaras e justificou o trabalho da Anvisa na análise das vacinas
O depoimento do presidente da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), nesta terça-feira, 11, na CPI da Covid, não foi boa para o governo Bolsonaro. Amparado pelo mandato definido de 4 anos, à frente do órgão regulador, sem qualquer chance de ser demitido, portanto, Antônio Barra Torres não vacilou em nenhum instante, seja para agradar ao governo ou à oposição.
No que tange ao governo, o dirigente da Anvisa fez questão de se colocar em campo oposto ao do presidente da República no quesito das crenças em voga no combate ao coronavírus, se afirmando ao lado da ciência.
Torres defendeu o uso de máscaras, desconsiderou a cloroquina como tratamento contra a Covid, criticou as aglomerações, inclusive com referência a Bolsonaro, e desacreditou a tese da imunidade de rebanho.
Sobre as expectativas da oposição, Barra Torres defendeu a rejeição, por enquanto, da vacina Sputinik V, produzida pela Rússia, que é defendida por governadores e oposicionistas como saída para a vacinação em massa nos seus estados.
Lembrou que a posição da Anvisa na rejeição à vacina russa foi tomada por unanimidade de técnicos e diretores. Ainda ao gosto da oposição, sustentou que as vacinas brasileiras têm documentação pendente para que possam ser autorizadas a iniciar os testes.
Não passou despercebido no depoimento de Barra Torres a lembrança sobre sua formação militar, que também é ostentada pelo presidente da República. “No meio militar uma coisa que é ruim é alguém querer ser alguma coisa que não é. Não almejo nenhum outro lugar do que o que estou agora”, enfatizou, em determinado momento, para criticar pessoas que ficam dando opinião sobre assuntos que não lhe dizem respeito.
Um dos tempos mais fortes do depoimento do presidente da Anvisa foi quando ele criticou a tentativa ocorrida em reunião ocorrida no Palácio do Planalto, quando a médica Nise Yamaguchi defendeu mudança na bula da cloroquina, acrescentando a ação contra a Covid como uma de suas faculdades. Conforme descreveu, sua manifestação foi dura, no sentido contrário, enterrando o assunto.
Instado a dar opinião sobre passeio de moto, com centenas de motociclistas, realizado no último domingo, Dia das Mães, em Brasília, pelo presidente Bolsonaro, Barra Torres considerou o evento como impróprio, repreendendo a aglomeração, segundo ele, não recomendada.
Ano passado, mais precisamente no mês de março, o presidente da Anvisa participou de aglomeração ao lado do presidente Bolsonaro, em frente ao Palácio do Planalto, o que foi cobrado pela oposição durante a oitiva.
Torres aproveitou a prensa para fazer autocrítica da sua atitude, dizendo-se arrependido pelo ato, segundo ele, impensado. ‘Se pensasse mais 5 minutos não teria feito [isso]’, disse.
Também, ao ser questionado sobre o comportamento anti-vacina de Bolsonaro, o diretor-presidente da Anvisa respondeu que isso “vai contra tudo o que temos preconizado em todas as manifestações públicas. Entendemos que a política de vacinação é essencial”.
A primeira consequência do que disse o presidente da Anvisa, na oitiva desta terça-feira, 11, será a convocação da médica Nise Yamaguchi, entusiasmada defensora da cloroquina e do kit covid, no tratamento precoce da doença, que é rejeitada pelos organismos internacionais da ciência e da Medicina. Ela deve explicar aos senadores porque defendeu mudar a bula da cloroquina.
Enfim, não foi bom para o lado do governo federal o que disse Barra Torres na CPI da Covid. Tanto assim, que segundo o portal O Antagonista, teria o presidente Bolsonaro demonstrado contrariedade com o depoimento.
Nesta quarta-feira, 12, será ouvido o ex-secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, que já criticou duramente o ex-ministro Eduardo Pazuello em entrevista à revista Veja, como responsável pelo insucesso na compra de vacinas da Pfizer, ano passado, o que teria feito o Brasil figurar, hoje, entre os países que estão na dianteira da vacinação, no mundo.
Um depoimento que tem tudo para ser mais um motivo de contrariedade para o Planalto.