Sérgio Botêlho – Em meio a um ambiente de tantas incertezas na vida política nacional, com reflexos que não podem ser devidamente mensurados, de pronto, na vida econômica e social brasileira, no rumo do futuro, eis que o Congresso Nacional impõe uma decisão meritória.
Nesta terça-feira, 05, deputados e senadores rejeitaram vetos presidenciais a duas leis que protegem financeiramente o setor cultural e, de quebra, homenageiam o compositor Aldir Blanc e o ator Paulo Gustavo.
Aldir Blanc e Paulo Gustavo morreram de Covid-19 em meio à pandemia que ainda hoje afeta o país e o mundo, sem que a morte nem de um nem do outro tivesse direito à mais simples mesura do poder federal, assim, à altura da representatividade nacional e internacional de ambos.
A derrubada do veto incluiu forte pressão do setor artístico nacional, por meio de caravanas de artistas a Brasília, nos últimos meses, o que terminou por garantir, ontem, o elevado quórum de votos parlamentares, ensejando a queda da negativa presidencial às referidas leis, imposta no momento da sanção.
A Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura e a Lei Paulo Gustavo, em seu conjunto, após sua promulgação pelo Congresso Nacional (sem mais necessidade de sanção presidencial) permitirão repasses iniciais de R$ 6,8 bilhões ao setor cultural.
Na Lei Aldir Blanc são relacionadas 17 ações e atividades que podem ser financiadas, a exemplo de exposições, festivais, festas populares, feiras e espetáculos, prêmios, cursos, concessão de bolsas de estudo e realização de intercâmbio cultural.
A Lei Paulo Gustavo repassa recursos diretamente a estados e municípios, a serem aplicados em atividades e produtos culturais, onde a maior parcela dos recursos deve ser aplicada no setor audiovisual.
Pesou decisivamente em favor da rejeição aos vetos a importância da produção artística, não apenas pelos seus efeitos benéficos no campo da sensibilidade humana, mas, sobretudo, frente à crise do segmento exponenciada pela pandemia do Coronavírus.
Com efeito, o setor artístico-cultural foi o segmento econômico mais abalado pela pandemia, chegando à paralisação total de suas atividades. Das artes cênicas à música, da moda à gastronomia, passando pelo artesanato, entretenimento, eventos e turismo cultural, o resultado da pandemia teve contornos de tragédia.
Por isso é que surgiram as ideias da Lei Aldir Blanc e da Paulo Gustavo com o propósito de reerguer minimamente o setor, reagrupando artistas e movimentos culturais, com a reconstrução de empregos perdidos, aos milhões, e, quiçá, a construção de outros tantos.
Portanto, enxergadas sob o prisma estritamente econômico – ainda que estivesse ausente a sensibilidade cultural e artística na mente de quem as examinasse – as duas leis já não se cabiam de tanta procedência, sendo uma completa falta de senso econômico e social o estabelecimento de vetos, mesmo parciais, aos textos. Quanto mais, vetos totais.
A atividade de criação artística, que envolve engenho e capacidade estética, compõe mesmo uma parte da economia, a chamada economia criativa, bastante levada a sério pelos países mais avançados do mundo.
E sem querer elevar o Brasil a uma potência artística em patamar mais alto que outros países, em qualquer setor da arte e da cultura a nossa querida Terra da Vera Cruz é hoje um dos expoentes mundiais, o que nos faz concluir pela necessidade de o Estado emprestar cada vez mais apoio ao campo, como um todo.
No cinema e na música, na literatura lusófona, no teatro e nas artes plásticas, nos mais variados retalhos da produção artística, o Brasil ganha destaque e protagonismo, o que, por conseguinte, exige crescentes investimentos públicos no setor.
Não há nenhum país no mundo, nos últimos séculos, que tenha durado mais que um piscar de olhos, perante a imensidão do tempo, na posição de algum protagonismo no concerto mundial, sem que se fizesse acompanhar de uma produção artística local reconhecida e admirada entre os contemporâneos internacionais.
E tanto mais força tem essa produção artística quanto mais liberdade de expressão e mais apoio do Estado tiverem os artistas.
E foi acreditando nessa tese tão simples quanto verdadeira que os idealizadores das Leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo lutaram pela aprovação de ambas. E, agora, pela derrubada de vetos tão inoportunos.