O governo e os espinhos do outono, por Sérgio Botêlho

Em meio ao regozijo do governo pela aprovação do Arcabouço Fiscal, há os espinhos do outono para perturbar

Por Sérgio Botêlho

A aprovação do Arcabouço Fiscal pela Câmara dos Deputados impulsiona as emoções do governo Lula em duas direções. Uma delas é, evidentemente, de alegria pelo resultado (372 votos a 108), que foi bem acima do necessário.

A outra, todavia, tornou mais notória a dependência do Planalto em relação ao Centrão e, mais especificamente, ao presidente da Casa, Arthur Lira, do PP de Alagoas. Este não perde a oportunidade de enviar recados ao presidente sobre seu poder. São os espinhos do outono.

O quadro se complica ainda mais com a oposição da dupla PSOL/Rede. Parte da esquerda deixou claro que nem sempre estará alinhada com os interesses do governo, chegando a votar contra, se necessário.

Do agrupamento de esquerda, uma ala do PT, apesar de ter votado a favor do Arcabouço, fez questão de expressar seu descontentamento com a matéria do governo. Como esse grupo vai se comportar na reforma tributária e em outras questões, ninguém sabe.

Depois do papel fundamental desempenhado por Lira na aprovação do Arcabouço, especialistas preveem um aumento ainda maior de seu poder no cenário político nacional. Também isso faz parte dos espinhos do outono.

Intromissão na organização administrativa do governo

Surge, ainda, em meio à euforia causada pela aprovação do projeto econômico do governo, a decisão que a Câmara tomou contra as medidas provisórias que reorganizaram a administração federal de acordo com os interesses do presidente Lula.

Lira dirige o processo legislativo com pulso firme, numa situação similar à que ocorreu durante o segundo mandato da ex-presidente Dilma, frente aos poderes do então deputado federal Eduardo Cunha, que tinha total controle sobre a Câmara. Todos conhecem o desfecho dessa história!

Enquanto isso, duas CPIs instaladas no Congresso Nacional servirão como um pano de fundo para invadir o palco: a dos Atos Antidemocráticos e a do MST. No mínimo, provocarão um aumento significativo no custo para aprovação de matérias do interesse do governo, como a tão esperada reforma tributária.

É essencial que todos estejam cientes de que estamos às vésperas das importantes eleições municipais de 2024. Lira já acordou com os bolsonaristas alagoanos para a sucessão na prefeitura de Maceió e em outras importantes prefeituras do Estado de Alagoas, na sua luta incansável contra o senador Renan Calheiros, este, um aliado próximo de Lula.

Assim, o cenário é de grandes dificuldades para o governo. Lula ganhou a eleição com uma maioria apertada, formada por pessoas de todas as cores partidárias, para resistir ao obscurantismo bolsonarista, composto por um grupo encantado pelas teses ditatoriais.

As massas

Testemunhei, em São Paulo, durante a última campanha, movimentos de massa realmente emocionantes, pois grandiosos, em apoio à candidatura de Lula. No entanto, a democracia brasileira é do tipo representativa, e não direta. Assim, o Congresso Nacional é quem detém o controle do jogo político, neste e nos próximos dias e meses.

Portanto, o que se faz mais necessário agora, do lado de Lula, é a unificação da própria esquerda, em apoio inequívoco aos interesses do governo, nos embates parlamentares, diferente do que aconteceu na votação do Arcabouço. Unida, já é complicado. Imagine, então, desunida.

Porém, parece haver uma fundamentação no que expressivos setores das esquerdas afirmam sobre a necessidade de os militantes dos partidos que as compõem voltarem a participar mais ativamente das organizações populares. Em outras palavras, retornar às bases.

O perigo, caso isso não ocorra de forma adequada, é uma derrota avassaladora nas próximas eleições municipais. Nesse caso, 2026 poderá se tornar um novo pesadelo.

Edição do Para Onde Ir: Sérgio Botêlho

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